A JURISPRUDÊNCIA DO CONCEITO CONSTITUCIONAL DA NÃO CULPABILIDADE

A JURISPRUDÊNCIA DO CONCEITO CONSTITUCIONAL DA NÃO CULPABILIDADE

Autores

  • Fabio Martins de Andrade
  • Adriana Freisleben de Zanetti Tribunal Regional Federal da Terceira Região

Resumo

NON-CULPABILITY DEFINITION ACCORDING TO THE BRAZILIAN SUPREME COURT

ÁREA(S): direito constitucional; filosofia do direito.

RESUMO: Por meio da análise da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) em torno do conceito da não culpabilidade e sob a ótica da doutrina falibilista desenvolvida por Charles Sanders Peirce, estudam-se as oscilações, no Brasil, acerca do momento no qual a execução da prisão decorrente de pena possa ser legitimamente deflagrada. O objetivo é analisar as ações, os contextos e os argumentos que rompem com estruturas e hábitos sedimentados pela Suprema Corte, em momentos diversos. Com efeito, desde a promulgação da Constituição da República, em 1988, o STF tem adotado orientações oscilantes e divergentes sobre a possibilidade ou não de execução provisória da pena depois de decisão de segunda instância e antes do trânsito em julgado. Inicialmente, entendeu que seria possível e não violaria o princípio constitucional da presunção de inocência. Em seguida, passou a decidir que não seria possível e depois retornou ao entendimento original anteriormente mencionado. Recentemente, no julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADCs) nºs 43, 44 e 54, ressurgiu a tese da impossibilidade da prisão, que não a de natureza cautelar, antes do trânsito em julgado da decisão condenatória. O artigo procura demonstrar que a razão de frequência contingente do conceito de culpabilidade confirma que o sistema jurídico não se orienta pela racionalidade conceitual abstrata, mas se sujeita a interpretante final falível. Para tal, utiliza-se o pluralismo metodológico preconizado pelo fundador da semiologia moderna: conjuga-se a análise empírica da jurisprudência do STF (indução) com inferências (dedução) da doutrina falibilista de Charles Sanders Peirce, para, então, extrair-se síntese provisória (não infalível). Examinando-se a prática do STF sob tal marco teórico, conclui-se que o sistema jurídico enfrenta, na atualidade, a mudança do paradigma interpretativo a priori e desloca sua normatividade para o momento da decisão judicial.

ABSTRACT: Through the analysis of the jurisprudence of the Federal Supreme Court (STF) and under Peirce’s falibilism doctrine, this article studies the oscillations around the moment in which the execution of the prison can be started against the defendant. The scope is to analyze the actions, contexts and arguments that break with structures and habits settled by the Supreme Court at different times. In fact, since the promulgation of the Constitution in 1988, the STF has adopted divergent opinions about the possibility of provisional execution of the penalty, after the second instance and prior to the final decision. Initially, the Court decided that it was possible to the defendant to start serving a prison sentence after this sentence has been confirmed by the tribunal, and that was no offense to the constitutional principle of presumption of innocence. Later, the STF overruled this precedent to rule that the prison could not be executed before the final decision. Yet, the STF overruled again this precedent, returned to the original understanding previously mentioned. Recently, by judging the Direct Actions of Constitutionality (ADC’s) nºs 43, 44 and 54, the thesis of the impossibility of imprisonment, other than precautionary reasons before the final decision was setle. This article aims to demonstrate that the contingent frequency of the culpability concept confirms that the legal system cannot be subsumed by abstract rationality. Instead, it is subjected to a fallible final interpretant. By analyzing STF’s jurisprudence with the lenses of falibilsim doctrine, we can come across the conclusion that the current legal system has shifted its normativity from a ‘a priori’ concept to the moment of the judicial decision.

PALAVRAS-CHAVE: não culpabilidade; Constituição; Supremo Tribunal Federal; prisão em segunda instância; falibilismo conceitual.

KEYWORDS: non-culpability; Constitution; Supremo Tribunal Federal; prision in the second instance; conceptual falibilism.

SUMÁRIO: Introdução; 1 Histórico jurisprudencial; 2 Falibilismo conceitual; Conclusão; Referências.

SUMMARY: Introduction; 1 Jurisprudential timeline; 2 Conceptual falibilism; Conclusion; References.

Biografia do Autor

Fabio Martins de Andrade

É Doutor em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (2010), Mestre pela Universidade Candido Mendes (2004), pós-graduado em Control Judicial de Constitucionalidad pela Universidad de Buenos Aires (2005), pós-graduado em Direito Penal Económico e Europeu pelo Instituto de Direito Penal Económico e Europeu da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em parceria com o IBCCrim (2004-2005), pós-graduado em Criminología pela Universidad de Salamanca (2002), pós-graduado em Derecho Penal Económico pela Universidad de Castilla-La Mancha (2001) e graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (2000). É autor de diversos artigos publicados em conceituadas revistas especializadas, importantes jornais e respeitados veículos cibernéticos. É autor dos seguintes livros: "Estudos de Direito Constitucional: Em homenagem aos 30 anos da Constituição Federal de 1988" (2018); "Temas de Direito Público: Homenagem aos 30 anos da Constituição Federal de 1988" (2018); "Direito Tributário - A advocacia no STF sobre temas estratégicos" (2018), "Grandes questões tributárias na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal" (2018), "Aspectos sobre a inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base da COFINS e do PIS" (2017), "A polêmica em torno do voto duplo: A inconstitucionalidade do voto de qualidade nas decisões do CARF" (2017), "Modulação e Consequencialismo" (2017), "Modulação & STF: A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre modulação" (2016), "Caso Marbury v. Madison: O nascedouro do controle de constitucionalidade" (2016), "Artigos jurídicos em escritos jornalísticos" (2016), "Modulação em Matéria Tributária: O argumento pragmático ou consequencialista de cunho econômico e as decisões do STF" (2011) e "Mídia e Poder Judiciário: A influência dos órgãos da mídia no processo penal brasileiro" (2007).

Adriana Freisleben de Zanetti, Tribunal Regional Federal da Terceira Região

Doutoranda em Filosofia do Direito pela PUC/SP. Mestre em Direito Previdênciário pela PUC/SP. Mestre em Direito Comparado pela Universidade de Samford - EUA. Graduada em Direito pela Universidade Paulista. Juíza Federal vinculada ao Tribunal Regional Federal da Terceira Região. Professora da graduação da Universidade Paulista. Membro honorário do Instituto dos Advogados Brasileiros - IAB. Membro da Comissão permanente de Direito Penal do IAB. Membro da Comissão permanente de Direito Internacional do IAB. Currículo: http://lattes.cnpq.br/1054596350351025.

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Publicado

2020-12-21

Como Citar

ANDRADE, F. M. de; ZANETTI, A. F. de. A JURISPRUDÊNCIA DO CONCEITO CONSTITUCIONAL DA NÃO CULPABILIDADE. Revista da AJURIS - QUALIS A2, [S. l.], v. 47, n. 148, p. 107–128, 2020. Disponível em: https://revistadaajuris.ajuris.org.br/index.php/REVAJURIS/article/view/1073. Acesso em: 5 maio. 2024.

Edição

Seção

DOUTRINA NACIONAL
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