JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL RESILIENTE: A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA

JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL RESILIENTE: A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA

Autores

  • Saul Tourinho Leal Universidade Humboldt de Berlim

Resumo

RESILIENT CONSTITUTIONAL JURISDICTION: THE BRAZILIAN EXPERIENCE

ÁREA(S): direito constitucional; teoria do direito; direito constitucional comparado.

RESUMO: A jurisdição constitucional tem dado provas da sua resiliência desde cedo. Nos Estados Unidos, quando o Presidente Thomas Jefferson avisou que não cumpriria uma possível determinação judicial obrigando-o a dar posse a um juiz indicado por seu antecessor e oponente, John Adams, a Suprema Corte, em Marbury v. Madson (1803), evitou um confronto direto, mas não sem antes cobrar uma fatura. Reconheceu-se competente para declarar leis inconstitucionais, num pioneiro exercício de legítima defesa institucional. Tornou-se, com a medida, a Suprema Corte mais poderosa do mundo. A Alemanha, por sua vez, conta com uma Corte Constitucional que ajudou na limpeza das ruínas materiais e imateriais deixadas pelo nazismo. Nasceu para resistir. Na África do Sul, o então Presidente Nelson Mandela criou uma Corte Constitucional cuja missão é evitar o triunfo de qualquer ensaio supremacista ou revanchista semelhante aos que forjaram o apartheid. Há mais. Enquanto o presente texto era concluído, dezenas de milhares de pessoas protestavam pelas ruas de Tel Aviv, em Israel, contra uma proposta de Reforma Judicial que retiraria o poder de dizer a última palavra em temas jurídicos da Suprema Corte e o entregaria ao Knesset, o Parlamento israelense. Lá, a jurisdição constitucional segue sendo resiliente, mas até quando? O Estado Constitucional brasileiro, todavia, não havia mostrado, ainda, esse espírito. Agora, tendo o Supremo Tribunal Federal sobrevivido aos quatro anos de duros ataques sofridos durante o governo do ex-Presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), a Corte mostra ao mundo que o que ocorreu em países como Venezuela, Guatemala, Polônia e Hungria – cujos governos conseguiram abalar a independência judicial – talvez seja um acidente, não necessariamente um destino. Quais mecanismos são esses, capazes de, na experiência brasileira, dotar a jurisdição constitucional de maior resiliência diante de crises extremas? O presente texto se dedica a identificá-los, estudá-los, categorizá-los e a concluir acerca da possibilidade de haver a sua institucionalização doméstica, bem como, quando crises extremas ocorrerem, aferir a possibilidade da sua utilização por outras jurisdições mundo afora.

ABSTRACT: Constitutional jurisdiction has proven its resilience from an early age. In the United States, when President Thomas Jefferson said he would not comply with a possible court order forcing him to swear in a judge appointed by his predecessor and opponent, John Adams, the Supreme Court in Marbury v. Madison, 1803, avoided direct confrontation, but did not leave it at that. The price was proclaiming itself as competent to declare laws unconstitutional, in a pioneering exercise of institutional self-defense. It became, with such measure, the most powerful Supreme Court in the world. Germany, in turn, founded its current Constitutional Court to help clean up the material and immaterial ruins left by Nazism. Born to resist. In South Africa, the late President Nelson Mandela created the Constitutional Court which mission is to resist to any supremacist or revanchist attempts similar to those that forged apartheid. As this text was being completed, tens of thousands of people were protesting in the streets of Tel Aviv, Israel, against a proposed Judicial Reform that would remove the power to say the last word on legal matters from the Supreme Court and would hand it over to the Knesset, the Israeli parliament. There too constitutional jurisdiction has been resilient, but for how long? The Brazilian Constitutional State, however, had not yet shown all this resilient spirit. But now, having the Supreme Federal Court (STF) survived the four years of harsh attacks suffered during the administration of former President Jair Bolsonaro (2019-2022), the Court shows the world that what happened in countries like Venezuela, Guatemala, Poland and Hungary – whose governments have greatly undermined judicial independence – is perhaps an accident, not necessarily fate. What are these mechanisms capable of providing, in the Brazilian experience, constitutional jurisdiction with greater resilience in the face of extreme crises? The present text is dedicated to identifying, studying, categorizing them and concluding about the possibility of their domestic institutionalization, as well as, when extreme crises occur, the possibility of their use by different jurisdictions around the world.

PALAVRAS-CHAVE: jurisdição constitucional; constituição e crise; Cortes Supremas; constitucionalismo.

KEYWORDS: constitutional jurisdiction; constitution and crisis; Supreme Courts; constitutionalism.

SUMÁRIO: Introdução; 1 O constitucionalismo: da euforia à maturidade; 2 A resiliência da jurisdição constitucional em tempos de crises extremas; 3 A experiência brasileira; 4 Elementos passivos, comunicativos e reativos; 5 Tentativas prévias de conciliação com pessoas políticas (passivo); 6 Tolerância com efeitos backlash (passivo); 7 Postergação de julgamentos acerca de temas sensíveis (passivo); 8 Ampliação dos canais institucionais de comunicação (comunicativo); 9 Diplomacia judicial (comunicativo); 10 Agendas específicas que firmam posição acerca de um tema (reativo); 11 O resgate – ou até mesmo a criação –, por meio da interpretação, de competências até então não desempenhadas tão intensamente pela Suprema Corte, mas que passam a ser fundamentais para a manutenção da sua autoridade e até mesmo para a preservação da sua existência (reativo); Conclusão; Referências.

SUMMARY: Introduction; 1 Constitutionalism: from euphoria to maturity; 2 The resilience of constitutional jurisdiction at times of extreme crisis; 3 The Brazilian experience; 4 Passive, communicative and reactive elements; 5 Previous attempts of conciliation with politicians (passive); 6 Tolerance with backlash effects (passive); 7 Postponement of verdicts involving sensitive topics (passive); 8 Enlargement of institutional channels of communication (communicative); 9 Judicial diplomacy (communicative); 10 Specific agendas which establish position about one topic (reactive); 11 The rescue – or even the creation –, through interpretation, of competences until then not so intensely performed by the Supreme Court, however become fundamental to the conservation of its authority as well as to preserve its existence (reactive); Conclusion; References.

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Publicado

22-08-2023

Como Citar

TOURINHO LEAL, S. JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL RESILIENTE: A EXPERIÊNCIA BRASILEIRA. Revista da AJURIS - QUALIS A2, [S. l.], v. 50, n. 154, p. 403–452, 2023. Disponível em: http://revistadaajuris.ajuris.org.br/index.php/REVAJURIS/article/view/1365. Acesso em: 11 out. 2024.

Edição

Seção

DOUTRINA NACIONAL
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